A municipalização do licenciamento ambiental na mineração

por Luciano Ricardo da Silveira em 19/Aug/2020
A municipalização do licenciamento ambiental na mineração

Uma das grandes discussões atuais acerca do desenvolvimento sustentável se dá no âmbito da elaboração de regras e marcos para a municipalização do Licenciamento Ambiental, num cenário onde cada vez mais a sociedade e os órgãos públicos gestores se convencem da necessidade de trazer o feito de avaliação de aspectos e impactos ambientais para próximo da localidade, que é onde de fato esses impactos são sentidos e operam suas maiores consequências econômicas, ambientais e sociais.   

Neste contexto, várias iniciativas têm sido tomadas, com um número cada vez maior de convênios firmados entre municípios e órgãos titulares da gestão de meio ambiente e desenvolvimento sustentável nos Estados. Trataremos aqui do exemplo específico de Minas Gerais e de como essa abordagem tende a ocasionar uma gradativa mudança na maneira como enxergamos o Licenciamento Ambiental de pequenos, médios e grandes empreendimentos, além de suas limitações, em especial na análise da avocação da competência municipal para o licenciamento de atividades de Mineração, seguramente um dos aspectos de maior controvérsia.        

Em Minas Gerais, o acordo firmado entre a municipalidade e o Estado faz parte de um programa de municipalização do Licenciamento Ambiental empreendido pela SEMAD-Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, conforme previsão da Deliberação Normativa COPAM nº 213/2017, com adesão de 117 cidades mineiras até então. É o caso, por exemplo, de Congonhas, na região Central e grande polo estadual minerário, que firmou acordo prévio em 2019 para exercer a competência de análise de processos de licenciamento ambiental de baixo impacto local, conforme a prerrogativa conferida pela Deliberação Normativa supracitada, observadas as hipóteses previstas por seu anexo único.  

Ato subsequente, o convênio definitivo do município em comento foi assinado em 24/06/2020, ampliando sua atuação na prestação de serviços ambientais e no licenciamento de empreendimentos e atividades até a Classe IV. O convênio, cumpre ressaltar, também permite ao município analisar os pedidos de intervenções ambientais em zona rural em bioma de mata atlântica, por exemplo, mediante a concessão de anuência prévia do IBAMA - obviamente - em atividade licenciadora que até então tramitava sob a competência una da SEMAD, através do IEF e seus escritórios regionais delegados.

No caso específico das atividades de Mineração, e aqui cito especialmente a extração do minério de ferro, responsável por considerável fatia do PIB mineiro, uma primeira análise nos permite dizer, no entanto, que a sujeição à competência de licenciamento ambiental municipal não é tão automática, por duas razões: primeiramente pelo porte e potencial poluidor dessas atividades, que sequer fazem parte do compêndio de atividades previstas pela DN COPAM nº 213/2017. Além disso, grande parte destes empreendimentos estão inserido em mais de um município, o que elide a hipótese de aplicação da competência municipal licenciadora, nos termos expressos pelo art. 3º da norma, senão vejamos:                

“Art. 3º Não serão licenciados pelos municípios, ainda que constantes do anexo único, os empreendimentos e atividades que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local:

I - enquadrados no art. 7º, inciso XIV e parágrafo único da Lei Complementar nº 140, de 2011, e nos respectivos regulamentos;

II - cuja ADA ou AID ultrapasse os limites territoriais do município, salvo quando houver delegação de execução da atribuição licenciatória;

III - localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União ou pelo Estado, exceto em Áreas de Proteção Ambiental - APA, nos termos do art. 12 da Lei Complementar Federal nº 140, de 2011;

IV - acessórios ao empreendimento principal, assim considerados aqueles exercidos pelo mesmo empreendedor e cuja operação é necessária à consecução da atividade ou empreendimento principal, nas hipóteses em que este for licenciável pela União ou pelo Estado;

V – cuja atribuição para o licenciamento tenha sido delegada pela União aos Estados;

VI – enquadrados nas hipóteses definidas pelo Decreto nº 45.097, de 12 de maio de 2009 ou pela Deliberação Normativa COPAM nº 169, de 26 de agosto de 2011.”

Some-se a isso o entendimento predominante e referendado pelo COPAM-Conselho Estadual de Política Ambiental, acerca da necessidade de consideração das atividades desenvolvidas em um complexo de mineração de modo integrado, o que se alinha ao disposto pelo art. 3º, inciso IV da DN COPAM nº 213/2017 e ratifica a não aplicabilidade do convênio firmado entre Prefeituras e SEMAD nesse contexto em especial, face à competência originária do Estado já exercida por suas Superintendências Regionais (SUPRAM´s, SUPPRI), em razão da regra estipulada pela Lei Complementar nº 140/2011, que fixa critérios para a definição de competências entre os entes federativos quanto à proteção, fiscalização e  licenciamento ambiental.

Não obstante a extrema valia e acerto estratégico quanto à municipalização do Licenciamento Ambiental, a observância das limitações impostas pela legislação e pelo próprio porte e escopo de algumas atividades e empreendimentos deverá sempre ser observada por gestores públicos, a fim de validar a gradativa atuação dos municípios, além de desonerar os órgãos estaduais da análise de processos e procedimentos, liberando-as às análises de feitos mais complexos e de maior potencial poluidor, o que ao final agilizará os trâmites e permitirá maior celeridade para o empreendedor e principalmente para a sociedade. 

 

 

Luciano Ricardo da Silveira

Advogado e consultor, atuante há vários anos nas áreas de Meio Ambiente e Mineração. Especialista em Direito Processual Civil, MBA em Direito, Gestão e Regulação Ambiental, Auditor Líder ISO 14.001, com histórico de atendimento a empresas como Anglo American, Vale, Petrobras, Arcelor Mittal, Yamana Gold, Samarco, dentre outras. Atualmente trabalha na CSN Mineração. 

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