Passo-a-passo para a apresentação de um estudo espeleológico

por Mariana Barbosa Timo em 19/Sep/2018
Passo-a-passo para a apresentação de um estudo espeleológico

O licenciamento ambiental é um instrumento que mantém a análise de viabilidade ambiental aplicada a projetos e atividades. Deve ser aplicado, obviamente, antes da sua implementação e tal prerrogativa deve ser aplicada a todos os tipos de projetos, especialmente aqueles que oferecem algum tipo de risco ambiental.

O início das atividades que envolvem o carste e as cavernas durante o licenciamento ambiental ocorre por meio da prospecção espeleológica. Tal atividade tem como finalidade a descoberta de cavidades naturais subterrâneas que ainda não sejam de conhecimento popular e/ou científico. No estado de Minas Gerais, a Instrução de Serviços n° 08/2017 ordena todo o processo de identificação e caracterização do patrimônio espeleológico no âmbito do licenciamento ambiental. Nos demais estados brasileiros, a execução dos trabalhos de prospecção deverão seguir os procedimentos e orientações disponíveis na página do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas – CECAV, vinculado ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio.

O diagnóstico do potencial espeleológico deverá considerar toda a Área Diretamente Afetada - ADA e seu entorno de 250 m e deverá resultar em um relatório de caracterização e avaliação da situação atual do patrimônio espeleológico da área de estudo sob a rubrica “Diagnóstico”. Nesta etapa, todas as cavidades identificadas devem ser caracterizadas e topografadas com um grau mínimo de precisão BCRA 4C.

Com o objetivo de determinar com precisão as áreas com maior potencial de ocorrência de cavernas, os trabalhos de prospecção devem ser precedidos de um estudo cartográfico da região, com ênfase na interpretação geológica. Além disso, devem ser elaborados mapas de campo com escalas diversas, abrangendo toda a área do empreendimento contendo a demarcação dos limites das áreas alvo do levantamento espeleológico definidas pelo empreendimento.

Analistas ambientais do CECAV elaboraram o Mapa de Potencialidade de Ocorrência de Cavernas, caracterizando as regiões brasileiras com maior probabilidade de ocorrência de cavernas de forma a aprimorar a gestão e, principalmente, as análises de processos de licenciamento ambiental de empreendimentos potencialmente lesivos ao Patrimônio Espeleológico.

Como resultado, foram definidas cinco classes de grau de potencialidade de ocorrência de cavernas: Muito Alto, Alto, Médio, Baixo e Ocorrência Improvável.

Em áreas onde a litologia ou os padrões morfológicos do relevo apresentam maior potencial de ocorrência de cavernas, o caminhamento da prospecção é realizado detalhadamente, ou de forma intensiva, com o objetivo de identificar o maior número possível de feições espeleológicas. Já em áreas onde a litologia ou os padrões morfológicos do relevo apresentam baixo potencial de ocorrência de cavidades e onde é possível obter um grande alcance de visão (e.g. áreas de pastagens), o caminhamento da prospecção é realizado de forma extensiva, ou seja, nestas áreas não se prioriza um adensamento da malha de caminhamento.

A atividade de prospecção exige processo sistemático de registros fotográficos e anotações. É necessário, também, a realização de uma análise da localização das cavidades e demais feições cársticas em relação à ADA do projeto.

O trabalho de prospecção possibilita um conhecimento detalhado do patrimônio espeleológico da área delimitada pelo estudo e busca contribuir para o incremento do banco de dados das cavernas presentes, no contexto regional e nacional. Esse trabalho orienta também os demais estudos de relevância de cavernas (arqueológico, geológico, paleontológico, biológico, topográfico, turístico) que irão compor o estudo de viabilidade ambiental do empreendimento. A etapa de prospecção é, portanto, fundamental para o êxito das etapas subsequentes, que envolverão diversos especialistas de diferentes áreas. Pode-se afirmar que ela é decisiva para a definição de direções e possibilidades do licenciamento, com a proposição de alternativas locacionais para o empreendimento minerário ou outros.

A etapa seguinte é a definição da área de influência das cavidades identificadas. De acordo com o art. 4º, §2º, da Resolução CONAMA nº 347/2004, a área de influência sobre o patrimônio espeleológico será definida pelo órgão ambiental competente que poderá, para tanto, exigir estudos específicos, às expensas do empreendedor. Segundo o §3º deste mesmo artigo, até que seja estabelecida esta área de influência, a mesma será estabelecida através da projeção em poligonal convexa de 250 metros a partir da projeção horizontal das cavidades naturais subterrâneas existentes na área de estudo. Porém, para que seja aplicado o disposto no Decreto Federal nº 6.640/2008, é necessário que a área de influência seja definida por estudos específicos. Para a elaboração destes estudos não existe legislação específica, contudo existem orientações na página do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas - CECAV.

Com o objetivo de se definir a área de influência das cavidades do projeto, devem ser avaliados os estudos existentes de diagnóstico das cavidades, visando a obtenção de dados de geoespeleologia, bioespeleologia e mapeamento topográfico de detalhe com objetivo caracterizar o ecossistema cavernícola nos âmbitos local e regional. Com esse conjunto de informações é possível definir uma área de influência externa que possa garantir a preservação do sistema cavernícola.

A relação com o meio, a localização, inserção na paisagem, geologia, hidrologia, morfologia e depósitos sedimentares permitirão uma avaliação da dimensão da questão em análise.

A área de influência das cavidades deve ser avaliada levando em consideração os parâmetros que possam interferir na continuidade de seu desenvolvimento e na manutenção do ecossistema cavernícola. Além disso, devem ser analisados os aspectos que podem causar impacto no sistema subterrâneo.

Em casos de empreendimentos que possam comprometer a estabilidade física das cavidades durante a sua operação, faz-se necessário um estudo sismográfico que garanta a integridade das cavernas e do carste local. As orientações para este levantamento também encontram-se disponíveis na página do CECAV.

Deve-se fazer uma análise da localização das cavidades, limite da área de influência e localização das demais feições cársticas em relação à ADA do projeto e, caso necessário, pode-se fazer alguma recomendação ou observação relevante ao estudo. É importante prever os impactos da instalação do empreendimento no patrimônio espeleológico. Prognóstico, instalação e descomissionamento.

A classificação da relevância das cavidades deve ser realizada caso exista a necessidade de impacto irreversível em alguma cavidade existente na ADA do empreendimento. Esta etapa está prevista no Decreto Federal nº 6.640/2008 e é regulamentada pela Instrução Normativa nº 02/2017 do Ministério do Meio Ambiente. De acordo com estes atos normativos, as cavidades naturais subterrâneas existentes na ADA e entorno de 250 metros podem ser classificadas, de acordo com seu grau de relevância, em máximo, alto, médio ou baixo. Esta classificação é determinada pela análise de atributos ecológicos, biológicos, geológicos, hidrológicos, paleontológicos, cênicos, histórico-culturais e socioeconômicos, avaliados sob os enfoques regional e local. É importante ressaltar que a legislação prevê a classificação de relevância apenas para as cavidades classificadas como “cavernas” e /ou “abismos” durante a etapa de prospecção espeleológica. Além disso, as cavidades naturais subterrâneas com menos de cinco metros de desenvolvimento linear que demonstrem a inexistência de zona afótica; destacada relevância histórico-cultural ou religiosa; presença de depósitos químicos, clásticos ou biogênicos de significativo valor científico, cênico ou ecológico;  ou função hidrológica expressiva para o sistema cárstico, serão consideradas de baixa relevância sem a análise de seus atributos e não devem ser consideradas para fins dos cálculos espeleométricos.

Para que a classificação da relevância possa ser realizada, uma busca precisa na bibliografia especializada deve ser realizada (dados secundários). Esta bibliografia é composta por revistas e anais de congressos de espeleologia, bem como, ao banco de dados do CECAV, CNC e demais órgãos ambientais licenciadores, e tem o intuito de levantar dados regionais.

Mariana Barbosa Timo

Engenheira Ambiental pela Universidade Federal de Ouro Preto (2005), Mestre em Geografia pela PUC Minas (2014) e atualmente cursa - como bolsista CAPES - o Doutorado em Geografia no Programa de Pós-Graduação em Geografia da PUC Minas e em Carstologia na Universidade de Nova Gorica, Eslovênia. No campo profissional, é diretora da Spelayon Consultoria – EPP e tem experiência na área das Geociências com ênfase nos seguintes temas em Espeleologia: Prospecção Espeleológica, Espeleotopografia, Geomorfologia Cárstica e Análise de Relevância de Cavidades Naturais Subterrâneas.

Deixe seu Comentário

Você também pode se interessar

© Instituto Minere

by nerit