Geociências de berço

por Guilherme Fonseca Lima em 21/Sep/2020
Geociências de berço

Não é raro alguém se referir a mim como “geogado” ou “advólogo”, que seriam figuras decorrentes da mistura de advogado e geólogo. Na verdade não sou nem uma coisa nem outra, sou advogado filho de geólogo. Aliás, filho de geólogo e geógrafa, então, justamente por isso, eu costumo dizer que nasci em meio às Geociências. Esse é um fato do qual muito me orgulho. Tudo o que sou, a pessoa na qual me transformei decorreu do esforço de meus pais no exercício árduo de suas profissões. Não há como dissociar esse universo da minha pessoa e é natural que eu tenha um amor incondicional pelo mundo da Geologia, da Mineração e da Geografia também. Não por acaso escolhi o ramo do Direito Minerário para atuar profissionalmente.

Assistindo a uma das lives protagonizadas pela Professora Marcela Tainã, através do Instagram do Instituto Minere, conheci o trabalho da Professora Andrea Sander, do Rio Grande Sul. Com muito entusiasmo e amor essa geóloga do Serviço Geológico do Brasil - CPRM se dedica à divulgação das Geociências nas escolas, especialmente para os professores, que se tornam multiplicadores da informação científica. Esse trabalho é hoje um projeto oficial da instituição, chamado SGB Educa. 

Fiquei fascinado e estabeleci uma identificação imediata com o esforço da Professora Andrea. Nas palavras dela: “não tem como não gostar de Geociências! Quem não se apaixona?” Para mim foi um processo natural e desde a primeira infância comecei a colecionar experiências no mundo da Geologia e da Geografia. A convivência com meu pai sempre teve um quê de fantasia e aventura. Até os meus quatro anos de idade vivemos em Belém, no Pará, pois ele trabalhava no Projeto Radar na Amazônia - RADAM. Eram comuns em nossa casa longas sessões de slides projetados na parede, com fotos de índios, rios enormes, animais selvagens, helicópteros pousados em clareiras abertas no meio da floresta. Surgia para mim um universo maravilhoso.

Quando eu tinha seis ou sete anos meu pai juntou-se a um grupo de colegas para construir um prédio de apenas quatorze apartamentos em Salvador, Bahia, dos quais doze pertenciam a geólogos, quase todos servidores da CPRM. As exceções eram meu pai, que trabalhava para a Companhia Baiana de Pesquisa Mineral - CBPM e outro vizinho que era geólogo de uma grande mineradora. Todas as crianças do prédio, os nossos melhores amigos, viviam mais ou menos no mesmo universo e ninguém tinha que explicar a profissão estranha que o pai exercia.

Lembro de vê-lo sair para as viagens de campo e da ansiedade que eu sentia à espera pela sua volta muitos dias depois. Sempre em pick ups e Jeeps sujos de lama, vinha trazendo histórias e novidades. Era como se meu pai fosse um desbravador, um bandeirante. Blusão de brim cheio de bolsos, mochila de lona com bússola Brunton, lupas, cadernetas com anotações, rabiscos e desenhos estranhos, martelo, mapas, amostras de rochas e minerais de cores e aspectos diversos, alguns muito estranhos e engraçados. De vez em quando surgiam lá em casa equipamentos fascinantes como teodolitos e alidades. Os GPS não existiam e ainda estavam longe de serem inventados, não havia computadores nem imagens de satélite, a Geologia era conhecida pela sola dos pés.

Desde cedo eu me habituei com um jargão incomum, palavras e expressões como azimute, lixiviação, testemunho de sondagem, aerolevantamentos, geofísica, green stone belt, eram comuns para os meus ouvidos. Quando me perguntavam o que meus pais faziam eu respondia: “meu pai é geólogo, minha mãe é geógrafa e trabalhava com geomorfologia”. Isso causava espanto para alguns adultos, ver uma criança falando assim com desenvoltura sobre esses temas.

Sempre que posso fazer alguma palestra ou aula na minha área de atuação, seja para que público for, aproveito para destacar a importância dos minerais para a humanidade, num esforço para esclarecer às pessoas “comuns” que elas são consumidoras de substâncias e produtos minerais e para demonstrar que não existe nada, absolutamente nada, em nosso mundo material, que não dependa de extração mineral.

A Mineração não tem uma boa imagem perante o grande público pelo fato das pessoas não associarem os produtos à sua origem mineral. Geralmente as atividades de extração mineral só aparecem na mídia quando ocorrem as catástrofes ou as ilegalidades. Não é raro alguém imediatamente pensar em garimpo degradando o meio ambiente quando ouve a palavra mineração. É uma grande desinformação e acredito que a transformação desse cenário só virá pelo fortalecimento da divulgação da Mineração e das Geociências no âmbito da educação formal e informal. É urgente a necessidade de construirmos uma agenda positiva para o esclarecimento da sociedade, pois a mídia jamais vai atuar nesse sentido. Todos os profissionais da área mineral podem, e devem, contribuir de alguma forma para plantar essas sementes e ajudar a mineração mudar do papel de vilã para o de orgulho nacional. E você, o que vai fazer para contribuir com essa corrente? 

  

Guilherme Fonseca Lima

Advogado especialista em Direito Minerário. Pós-graduado em Direito Civil na área de contratos. Atua para empresas mineradoras e entidades do setor mineral. Coautor dos livros “Direito Minerário em Evolução” e “A Compensação Financeira Pela Exploração de Recursos Minerais” produzidos pelo Centro de Estudos Avançados em Mineração - CEAMIN, de MG.

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